Dizer não: Porque não devemos dizer não, sempre que não for para dizer não

Sacou que o assunto aqui é dizer não, não?

Desde meu ensino médio ouvia que não devemos usar tanto a palavra não, por ter um peso negativo. Que devíamos exercitar para usar frases mais positivas. Confesso que acho muito difícil, pois essa coisa do não tá instalada fortemente em nossa cultura e simplesmente não sabemos usar menos não na comunicação. Um mega desafio. Também já ouvi que não devemos dizer não para crianças. Para não bloquear sua criatividade, autonomia, autoconfiança, etc.

Quando o Ben nasceu comecei a refletir sobre isso. Em um momento me dei conta que o problema não é a palavra não, mas como a usamos.

Percebi também que crescemos ouvindo não e naturalmente ao mudarmos de lado a tendência é repetirmos sem perceber. Por isso a importância de se estudar sobre maternagem para poder refletir e quebrar esse ciclo negativista.

Aqui entram um pouco dos rótulos que ouvimos:
– Essa criança é arteira.
– Ele é bagunceiro.
– Só faz arte.
– Mexe em tudo.

Natureza da criança

Gente, não é “arte” ou bagunça, é a natureza da criança. Elas são assim porque são crianças. Se não tiverem esse comportamento serão adultos. E bloquear o comportamento nesta fase equivale a criar um problema futuro. Eu gosto de aplicar a lei do karma, da ação e reação. Assim, sempre que impedirmos o que é da natureza da criança vamos ter que lidar com as consequências que isso vai gerar mais adiante.

Crianças chegam ao mundo com uma tela em branco. Elas caem aqui tendo que aprender o sentido de tudo. E vão levar alguns anos para compreender como as coisas funcionam. Então precisamos ajudá-las, pois somos os “adultos da rodada”.

Se falarmos não para tudo, o tempo todo, o não vai perder o sentido. Aí fica difícil manter a comunicação.

Você já esteve com uma mãe que fala não o tempo todo para uma criança? Se você não tem esse hábito, provavelmente se sentirá irritada. É como eu me sinto.

E sobre estar com uma criança e precisar dizer não o tempo todo? É uma situação que te deixa desgastada e triste porque você sabe o quanto está sendo inadequada, mas não consegue ter sucesso na comunicação.

Dizer não pode gerar um vício

No meu entendimento, esta é uma criança viciada em “não”. De tanto ouvir, ela simplesmente ignora o significado da negativa e quando a ouve, ignora. Desta forma, temos que usar uma energia imensa para transmitir a mensagem de outra forma. Como não sabemos fazer isso, somos tentados a apelar para castigos, ameaças, chantagem e outras formas violentas de agir, ou a sermos permissivos.

Sermos incoerentes e irresponsáveis nas negativas vai custar a harmonia da família, vai nos deixar mais cansados e causar desafios emocionais e psíquicos no futuro que não são simples de resolver. Sabe aqueles nossos defeitos que queremos superar e não conseguimos?

Eu sou escoteira. E sempre que alguém se depara com um emaranhado, vem até mim dizendo: – A Lígia é escoteira, ela sabe desmanchar. Então respondo: Gente, o escoteiro não desata emaranhado, nós justamente aprendemos a fazer o nó correto para não ter que lidar com o emaranhado. Então é isso, não crie nós, crie laços.

Vamos categorizar para dizer não na medida

Ao assumir a maternagem precisamos fazer um exercício do que REALMENTE precisamos dizer não pode, do que pode mas NÓS não queremos, e do que é permitido.

O não que é não

O que REALMENTE não pode é quando o não é realmente não. Não pode colocar a mão na tomada, bater no amigo, estragar e desrespeitar as coisas e pessoas. Não é legal lamber o chão, a roda do carrinho, a sola do sapato. todas as questões de higiene, segurança e saúde. Essa parte é muito clara.

Quando o  não diz respeito ao adulto

Também nos deparamos com uma gama de coisas que NÓS não queremos, mas que elas podem ser feitas. Aqui entra a encrenca e é onde devemos refletir e nos posicionar com clareza para não ferrar a vida da criança e a nossa.

A criança pode fazer barulho quando queremos ver TV, nós que não queremos que ela faça.
Ela pode correr, gritar, pular quando nós estamos cansados e com preguiça de correr, pular, ir atrás dela.
É natural da criança mexer em tudo que está a sua volta, pois a curiosidade é natural e é a forma que ela aprende a compreender o mundo. Nós que não queremos que ela mexa e não nos damos ao trabalho de reajustar o ambiente para ela.
Ela gosta de demorar no banho e espalhar água enquanto brinca, nós que não temos paciência de esperar o banho demorado ou estamos cansados para limpar o molhado.
A maioria das coisas que dizemos não, são coisas que podem ser feitas, mas nós não queremos porque estamos pensando em nossa comodidade, limitação, interesses e não sendo empáticos com a criança. E é quando nos atrapalhamos nesta parte que viramos os monstrinhos negadores que corrompem o senso de não da criança e as transforma num monstro que nós mesmos não aguentamos.
Sabe a expressão “eu criei um monstro”?

O não que precisa ser sim

E tem as coisas que podem. E criança pode tudo, elas tem prioridade. Precisam explorar, experimentar, preencher a tela em branco durante a infância para se tornarem adultos sem limitações e neuras no futuro. Elas podem tudo, exceto o que é realmente perigoso.

Como lidar com isso?

Primeiro, temos que entender que criança é criança e adulto é adulto. Precisamos respeitar seu entendimento e não esperar que dizer não para um bebê fará que ele o entenda. Ou que uma criança de 3 anos vai conseguir segurar sua curiosidade natural porque dissemos não faz isso. Ela não vai, ela não tem que bloquear a curiosidade, pois está na fase de vivenciá-la.

E o que fazemos para colocar ordem nessa bagunça do não real, do que não queremos e do que pode?

Elimine o que não pode

Primeiro eliminar o máximo do que realmente não pode, para não precisar dizer não. Tudo o que pode gerar acidentes graves deve ser eliminado ou ir para o alto. Produtos de limpeza, tomadas, armários que podem cair, facas, vidros, essas coisas todas precisam sair do território da criança. Faz parte do pacote de ter filhos e isso vai permitir que você fique mais descansado.

Claro que teremos coisas que não temos como eliminar, e para essas iremos falando não de forma adequada a cada idade. O não para o bebê significa distraí-lo com outro objeto (é mais efetivo do que só falar não ou tirá-lo do que não pode, pois ele irá voltar, e você vai repetir o não, e vai ser aquela chatice). Aos dois anos, o não começa a ser assimilado, mas geralmente não é uma ordem executada. É aquela briga entre o sentido da palavra e a curiosidade que geralmente vence. Pelos 3 ou 4 anos o entendimento é melhor e você consegue melhor resultado (eu imagino). Outras formas é ir ensinando a criança a lidar com essas coisas.

Ex. O sofá que não podemos jogar fora. Enquanto for bebê e ele estiver no sofá precisamos segurá-lo. Assim que ele tiver condições de subir no sofá, devemos ensiná-lo a descer de forma segura.

Proteja o que não pode ser eliminado

Quinas devem ganhar proteção.
Se o piso escorrega, não dá para dizer para uma criança não correr porque o piso é liso. Ensina ela a usar a sapatilha. Quando ela começa a ter entendimento vai explicando que deve ter cuidado pois o piso escorrega. E o que ela faz que escorrega. Aqui em casa temos uma sacada com piso frio que molha quando chove. Então mostrávamos ao Ben onde estava molhado e explicávamos que escorregava. Sempre alertamos quando ele ia para a sacada na chuva. Ele caiu umas três ou quatro vezes até aprender a dinâmica da coisa. Mas nunca ficamos naquela chatice de não ai, não vai, sai daí, etc.

Permita mais

Enquanto escrevo Flora, com 7 meses, pegou a térmica do chimarrão. Eu deixei que explorasse o objeto cuidando pra que não se machucasse. foram 5 minutos de exploração antes de ir para outro objeto. E nenhum não foi dito.

Assuma a responsabilidade

Se o ambiente não for preparado para a criança, o adulto deve protegê-la e não esperar que ela o faça. Eu acho mais fácil preparar o ambiente.

Se não quero que meu filho se suje, não leve-o em local que isso pode acontecer. Porque é insano levar a criança na pracinha e não deixar que ela suje a roupa não é?

Avalie

Eu também faço uma categorização das coisas que podem mas eu não quero. Tem as que não quero mesmo e tem as que não quero mas vou permitir. As que você não quer mesmo, devem sair de circulação e ser evitadas. Tipo eu não queria que o Ben brincasse com minha coleção de elefantes para que não quebrassem, então guardei. Mas tinha alguns que não quebravam e que mesmo eu preferindo que ele não brincasse, abri mão do meu “não” e permito que brinque quando pede.  Também não gosto que ele faça farelo no sofá, então o convido a comer biscoito na sacada.

Escolha aquelas que você não gostaria que acontecessem e tente abrir mão por amor ao seu filho. Tipo se sujar na pracinha. Ou tirar suas panelas e potes da cozinha, etc. É chato, vai ter que arrumar tudo depois, mas é só uma fase, logo passa, vale o sacrifício.

Por fim, crie um ambiente adaptado com todas as coisas que seu filho pode fazer. Assim, ele vai saciar sua necessidade infantil, vai crescer com segurança e, com certeza, irá aprender o que é não de forma adequada e sadia. Ah, e melhor, ele saberá mostrar isso de forma positiva ao seus filhos no futuro.

E você quais os desafios? Como lidou com o não e a adaptação de sua casa?

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